Quando, num sono aéreo, tudo dorme,
E a treva lembra luz adormecida…
E o silêncio, quimérico e disforme,
É só uma canção interrompida…
Quando um pinheiro, além, na indecisão
Da noite, que o perturba e lhe faz mal,
Se vê, perdido em vaga confusão,
Tornar-se um ermo e vago pinheiral;
Quando, na sombra espessa, ó minha fonte,
Desliza, anseio de água, a tua voz,
De som molhando o rosto do horizonte,
Que sofre e chora, às vezes, como nós…
Quando em paz tudo dorme, eu sonho e cismo.
Remorso? Exaltação? Delírio a arder?
E ouço vozes, que vêm dum fundo abismo,
Por minhas mãos aberto no meu ser!
E ouço vozes e passos… Quem me fala?
És tu, ó chuva? Ó vento? Ou serei eu?
Ah, como distinguir a minha fala
Das vozes que andam, tristes, pelo céu!
Já de tanto sentir a Natureza,
De tanto amar, com ela me confundo!
TEIXEIRA DE PASCOAES (1877-1952)
As Sombras, À Ventura, Jesus e Pã