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Faixa Sonora

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

SOU UM LUGAR...




Sou um lugar carregado de cactos junto à água, lua,

os animais com um clarão na boca, sou

uma ciência a sangue. O sítio ainda agora no cérebro:

jarro de vidro cheio de leite, o sal. Estes

elementos arcaicos – e as mulheres

sombrias

cantando. Sou um lugar que transborda.

Espancaram a luz atrás das costas: de onde eu vinha,

criança branca do mundo. Defronte os fogos

lavravam-me a testa.

Podia dançar sobre as áscuas. Podia ser tão silvestre

entre as folhagens do ouro, ter cornos, negra

máscara aterradora, silvar

como uma cobra.

Eu entrava na morte, era o filho da estrela

bárbara – erguia-a do meio dos diamantes.

De equinócio a solstício abraçava-me uma onda

quando subia, quando

se despenhava eu dormia dentro como um olho de água.

Depois o rosto obscuro.

Depois a seda fiada atrás do rosto.

Não espero nada.

Espero o dom apenas de uma imagem.

 

HERBERTO HELDER (1930)

Poesia Toda

 

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